Wednesday, December 21, 2005

O fim de um Ciclo ou A maravilhosa inconsequencia de ser Portugues

Queridos leitores,

Passaram-se quase três meses desde que decidimos encetar esta odisseia (de cariz iniciático) por entre os meandros do bloggismo baseado no (pouco) puro escárnio e mal-dizer; viagem essa que se pretendia, acima de tudo, purgatória de todos os males e pecados que parecem afectar a noite clubística (no sentido claramente londrino) portuguesa. A certa altura pareceu-nos necessário esclarecer que não passávamos de meros espectadores, que, no fundo, no fundo, sabiam muito bem o que pretendiam escrever, e a quem pretendiam chegar. De um momento para o outro, tinhamos esses próprios alvos a reagirem sob diversas formas e tipologias, desde o covarde comentário anónimo até ao corajoso assumir da identidade, com resultados mais ou menos felizes. Assim, inicialmente um tiro no escuro, o Fratricida tornou-se um caso de sério sucesso junto de uma emergente comunidade composta por clubbers, djs, ravers da pastilha, pseudo-djs, music geeks, pseudo-intelectos, gunas de boné, groupies dos djs, e um ou outro doente mental com uma estranha obsessão por sexo anal, proveniente, geralmente, do leste da Europa. Purgatória ou não, o simples facto de termos posto todas estas cabeças a pensar e a manifestarem-se, seja sob a forma de iluminados raciocínios discursivos, ou sob a forma de parca diarreia mental com origem óbvia em cólicas intestinais, fez com que todo este travail-du-jour valesse a pena.

Como um amigo próximo me fazia entender há dias, é fácil perceber que qualquer tipo de aspiração a estatuto de "underground" por parte de um qualquer grupo que se reúna para celebrar a última grande trend proveniente de uma qualquer sociedade cosmopolita europeia, é hoje em dia, em vão. Longe vão os tempos em que um singular booker geria a vinda do DJ A, B ou C, ao bar X, Y ou Z, e trazia sempre a mesma trupe de groupies atrás, altura essa em que realmente, toda a gente se conhecia. Ainda que seja necessário congratular as pessoas que desempenharam tais papéis, que despoletaram processos que deram origem à club scene portuguesa, o desenvolvimento do mecanismo de democratização da noite alternativa trouxe consequências de todo o tipo para si própria. Uma delas, e talvez a principal, será o impossibilitar da concretização do próprio conceito de underground, que passou a ser impossível de co-existir com o conceito de clubbing fechado em si mesmo, não expansivo. Por outro lado, o espartilhar das indústrias culturais que gerem o entretenimento público em tempo de crise, não parece intervir, felizmente, nas subculturas de origem e vivência urbana e é por isso que no nosso país podemos e temos a oportunidade de viver à margem de rebanhos, havendo espaço para pensar X, Y, Z, dizer X, Y, Z, dançar X, Y, Z.

Será questionável afirmar que é próprio da condição de homem contemporâneo português, habitante de Portugal, a necessidade de mal-dizer, ou até, de uma perpectiva popular, chegar atrasado, cuspir para o chão, ou deixar tudo para "a última". A urgência em dar um salto para uma possível generalização e classificação estratificada é-nos inerente a todos, talvez por ser própria do espírito mediterrânico uma certa atitude derrotista e auto-complacente para com os nossos singulares defeitos. Por isso, se inicialmente vos pareceu, a vós leitores, que nos tinhamos dado ao trabalho de criar um blog com o puro propósito de "dizer mal", como em alguns fóruns se fazia comentar, chega agora altura de vos mostrar que sabemos prestar valor a quem valor é devido...

A típica atitude de índole indy/alternativa resultante das amarras de um regime ditatorial será provavelmente, a característica do povo português que mais me apraz. E é por esta simples razão que estou a escrever este post: obrigado a todos por podermos ter escrito aquilo que escrevemos; obrigado a todos por podermos falar do Lux, dos Freshkitos, do Rui Trintaeum, do Trintaeum, do Mário Roque, dos Dezperados, do Roman Flugel, da Dance Club, do Tó Pereira, do Rui Vargas, do Indústria, do Antony Millard, do Fradique, do George Clinton, do Carl Craig, do Tiga, do Traibal Áuzzz, do Chus & Ceballos, do Paulo Amado, do Paulo Roque, do Pete Tha Zouk, da electrónica experimental pós-Concreta, dos Pseudo-Intelectos que a ouvem, do DJ Nuno Bessa, do DJ Ric M, do DJ Luigy, do Richie Hawtin, do Ricardo Villalobos, do Luciano, do Frágil, do António Alves, do Ka§par, do Rui Murka, dos MFA, dos 2 Many DJs, do Craig Richards, do Fabric, do Clube Mercado, do Kid Loco, dos Local Heroes, dos Rhythm & Sound, do Fabrice Lig, do Nuno Branco, da Sonic, do Zé MigL, do Tiago Miranda, do Bazaar, do Tim Sweeney, do Dexter, da Dance TV, da Tânia Pascoal, do Homo Chungus, do DJ Pantaleão, do Rainer Truby, do Dego, do Kevorkian, da Force Tracks, dos Fischerspooner, do Fernando Rocha, dos Hardfloor (avé), dos Ramstein, do Kitten, do Erlend Oye, do Captain Kirk, do A. Paul, do Ferro, dos The Advent, do Clube Lua, do Expander, do Mix MC, dos Tigertails, da Casa da Música, do Dinis, do Passos Manuel, dos Maus Hábitos, das Anitas, do DJ Yellow e do Matulão Moldavo...

O mais sincero Obrigado a todos por se fazerem existir.

É sinal que temos alternativa.


Até à próxima ;)

Dalila