Sunday, December 04, 2005

A "electrónica" na TV Shop ou Darwin sobre a Dance TV

Hoje sinto-me esgotada das ideias, vou ter de apontar canhões a um assunto préviamente pouco discutido, talvez por ser demasiado fácil troçar dele.

Sempre gostei de animais - longe de ser no sentido em que a Cicciolina gostava - e lembro-me distintamente de um episódio da BBC Wild Life em que o David Attenborough entrava de cabeça numa estrutura feita por térmitas, nas planícies mais desertas do Serengeti, e que me causou o mais respeitoso espanto. Para cultura geral sobre as espécies que nos rodeiam, não há como os clássicos documentários.

Hoje em dia, a fauna parece mais ampla - a ciência desenvolveu-se e não faltam espécies por descobrir - os peixes-dragões que habitam os corais da Nova Zelândia, as estranhas alforrecas gigantescas nas profundidades das Marianas, os répteis primitivos no interior da Austrália.

Em certas augustas ocasiões a Sic Radical emite um programa de zoologia muito interessante que me faz lembrar esse formato de documentário televisivo, e apresenta uma selecção muito curiosa e pouco estudada de espécies.

Falo, está claro, da Dance TV.

Algures entre a evolução do Australopitecus para o Homem de Neandertal, houve um desvio evolutivo que degenerou num vasto filo de espécies humanóides, todas elas podem ser vistas semanalmente neste educativo e didáctico espectáculo televisivo.

O mais curioso é que é produzido, apresentado e rodado por membros desta espécie desviada do tronco evolutivo comum. Todos os intervenientes deste produto televisivo pertencem ao homo chungus.

Para os que não estão convencidos das capacidades do chungus para executar tal feito, apresento já razões de falácia a tal elação : as apresentadoras gesticulam uma linguagem que - curiosamente - quase chega a ser português... rudimentar, repare-se, mas a dois ou três anos de escolaridade de uma criança do quinto ano - e os entrevistados nas festas emitem grunhidos que (segundo últimas traduções) correspondem a um dialecto primitivo desta língua.

O homo chungus é uma espécie que em muito depende do comércio na sua vertente mais embrionária - a troca de favores. No caso do homo sapiens, é sabido que o comércio começou com a troca de ovelhas, de peças de olaria, ornamentos, adereços ou camelos, mas esta espécie adopta a política da troca de favores.

Repare-se: se a Tânia Pascoal actua no Kremlin, leva a sua tribo para filmar a festa, entrevistar o live act que acompanha o dj set - em que a cadência há-de incidir no chamado elétróauzz, com os imprescindíveis traços de traibalauzz - e falar com os nativos sobre o fantástico ambiente que se experiência na comunhão chungosa das cavernas da 24 de Julho. Assim devolve-se o favor desta casa nocturna ter albergado o evento.

Em seguida - como é certo - não falta o calendário de festas, onde todas as datas dos djs que produzem ou apresentam o programa vão estar em destaque, bem como uma linha ou outra dedicada aos patrocínios que investem na realização deste evento - e no pagamento dos seus milionários cachets (que garantem duas horas de árdeelétrotraibalprogauzz em cds ripados).

Aqui se percebe a mentalidade central do homo chungus, a exploração máxima dos recursos possíveis - tal como baratas, ténias ou mesmo as amibas e outras bactérias, que se reproduzem e devoram qualquer substracto nutricional até mais não haver. Se se tem um programa de televisão, este deve, claramente, ser usado para divulgar o seu - certamente primitivo - trabalho, mais do que informar os telespectadores do que de realmente importante se faz pela música dançável em Portugal - isto, segundo a perspectiva chungosa.

Contudo, por muito curiosa que seja esta abordagem (que por muito pouco não se apelida de esperta), existem falhas nítidas que põe em evidência a escassa capacidade intelectual dos chungus, quando comparados com o homo sapiens. Entre elas, a excessiva recorrência a expressões como "desta feita" (por exemplo : esta noite fomos à discoteca Big Cansil, em Sta. Maria da Feira, pra 3a edição da festa Woman Is Tribal, desta feita dedicada à Tânia Pascoal) ou a completa incapacidade de conseguir compreender qualquer música fora do meandro quaternário óbvio, com decência (por exemplo, irem a uma festa de nujazz, e na entrevista ao dj tocarem um tema de hardhouse no background).

As conversas com o "party people" - expressão também amplamente utilizada nesta série - são os momentos que correspondem aos de dois leõezinhos a brincarem na savana (ou seja, é a parte que nos rimos com compaixão). Seguem mais ou menos esta lógica:

- Então, o que 'tás á achar da festza?
- Yah, baril, o grelo é fixe, a música é bacana e levava-te p'ra casa. (Risos)

e prossegue...

- E vieste por causa da BACARDI ou por causa do Peter Tha Zouk?
- Pás... eu vim porques o meuzamigues quiserem ir curtir a naite, e acámozes aqui, mas já tinhóvido falar c'o Peter ia tar a debitar. E a BACARDI é bué fixe, p'qu'as bailarinas têm uma g'anda peida. Curto bués quando Peter começa e faz aquele espatáquelo com o fogos d'artefiço e toca a música dos Portish - q'a minha namorada té gosta, majeu acho muito romântique.

(Repare-se na política do negócio por favor, sempre patente, a Bacardi, o Peter...)

Outra coisa não seria de esperar de um programa que nasceu da mão de um dos muitos homo chungus que se dissimularam na sociedade da comunicação social (alguns argumentam que na imprensa musical portuguesa haja uma percentagem elevada destes) e que há dez anos já estava a fazer dançar o seu primo - o macaco Hadriano; tocando temas que apenas os da sua espécie compreendem (como Saturday Night, Night Train, etc...) -; falamos, obviamente, d' O DJ Pantaleão, ou ainda, na sua vertente mais underground traibal-progue: DJ FOX.

Esperemos pelo salto evolucionário...

Dalila, a nova Diane Fossey